O fim da Primavera Árabe e o caso da Síria
Mundão

O fim da Primavera Árabe e o caso da Síria


Bashar Al-Assad, presidente sírio.
Por Andrew Patrick Traumann *

Muito se tem falado sobre os acontecimentos na Líbia, que parecia ser a próxima pedra do dominó árabe a cair após os levantes da Tunísia e Egito. No entanto, o tempo se encarregou de mostrar que os protestos  na Líbia possuem um caráter muito diferente do que ocorreu em países vizinhos. A oposição líbia na verdade não possui compromisso algum com reformas democráticas e o perfil de seus integrantes está muito mais ligado a uma luta tribal com nuances nacionalistas do que a revolução comandada por jovens integrados a redes sociais como vimos no Egito.
Em outras partes do mundo árabe revoltas também vêm ocorrendo desde o início do ano, mas podemos afirmar que a chamada Primavera Árabe vive seus estertores. Iêmen, Bahrein, Jordânia e Síria ainda vivem um clima politicamente agitado, mas devido a questões pontuais e localizadas,as quais seria um equívoco relacionar com o que ocorreu na Tunísia e no Egito. O Iêmen é tribalizado e isolado demais para ser inserido neste contexto, no Bahrein a revolta é claramente de ordem religiosa e não social (a maioria xiita é oprimida por um governante sunita), e na Jordânia a promessa de reformas parece ter arrefecido o ânimo dos manifestantes. Já a Síria, possui particularidades que deveriam a princípio transformá-la no centro das atenções do noticiário internacional não estivessem as potências ocidentais intervindo na Líbia.



A Síria exerce influência no Iraque, territórios palestinos e Líbano. Possui um acordo de mútua defesa com o Irã, sendo seu principal aliado na região. Como nenhum acordo de paz jamais foi assinado com Israel após a Guerra dos Seis Dias, tecnicamente os dois países ainda encontram-se em guerra e o governo de Bashar Al Assad,assim como o do seu pai Hafez apoia o Hamas. Damasco considera o Líbano sua zona de influência, inclusive ocupando  o território libanês até 2005. Com o Iraque, a Síria possui relações históricas já que os dois países eram governados pelo mesmo partido, o Ba’ath durante décadas. Após a invasão norte-americana o pragmático governo de Bashar Al Assad optou por apoiar a posição norte-americana de estabelecer um governo de “união nacional” (entre sunitas, xiitas e curdos) no país.
Devido a todos estes fatores, a Síria é um país de suma importância no mundo árabe. Qualquer evento que ocorra no país repercute imediatamente em toda a região, pois qualquer mudança na política local interfere nas relações com Líbano, Irã e na delicada questão palestina. Porém, a dinastia Assad lidera um dos regimes mais fechados e repressores do mundo, no qual a população vive sob estado de emergência há quase cinqüenta anos. Os direitos civis inexistem, e o regime pode prender quem quiser sem mandado  judicial, proibir manifestações e reuniões e controlar totalmente a mídia local. Milhares de pessoas foram torturadas e mortas ao longo destes anos. O caso mais célebre foi o massacre na cidade de Hama, em 1982, quando, segundo estimativas independentes, as tropas sírias mataram cerca de 20 mil pessoas. Os sírios vivem com medo mas  é fato também  que boa parte da população apoia o atual regime muitas vezes por identificarem “modernidades” como a democracia e os direitos civis com intervenções ocidentais e por não terem conhecido outro regime, afinal nos últimos cinqüenta anos foram apenas dois presidentes,pai e filho. Na capital Damasco o presidente tem procurado comprar apoio da sua base o funcionalismo público com aumentos de salários. O regime obviamente permite e estimula manifestações a seu favor, enquanto reprime a oposição, porém é inegável que Bashar possui um genuíno apoio popular o que difere ainda mais o caso sírio do processo ocorrido na Tunísia e Egito e faz com que todos percebam as particularidades de cada país e sociedade árabe, que não são, definitivamente, monólitos uniformes.
*Andrew Patrick Traumann, mestre em História e Política pela UNESP e doutorando em História, Cultura e Poder pela UFPR é professor de História das Relações Internacionais do UNICURITIBA.



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