Mundão
Unidos pela crise
Gustavo Glodes-Blum
Assinado na terça-feira, dia 02 de novembro, o tratado entre Reino Unido e França apresenta uma característica inovadora no processo de integração europeu: as novas direitas voltadas à restrição fiscal podem ser o seu novo motor.
No último dia 02, terminou em Londres, capital do Reino Unido, a primeira Cúpula Reino Unido-França. Reunidos desde o sábado, dia 30, os governos dos dois países liberaram uma declaração conjunta sobre assuntos de extrema importância e sensíveis para a política européia atual: defesa, segurança e imigração.
David Cameron e Nicolas Sarkozy tiveram caminhos políticos diferentes. Sarkozy foi Ministro do Interior e das Finanças (cargos parecidos com os de Chefe da Casa Civil e Ministro da Fazenda) durante a presidência de Jacques Chirac. Líder do partido de centro-direita União por um Movimento Popular, Sarkozy tem tido uma política estrita de reforma fiscal e tem enfrentado grandes problemas com relação à imigração e a reforma previdenciária numa França envelhecida e com sua população de imigrantes na sua segunda geração. No mesmo dia, era o alvo preferencial de um conjunto de cinco bombas enviadas a embaixadas na Grécia.
Por sua vez, Cameron é o jovem líder do tradicionalíssimo Partido Conservador do Reino Unido. Ao contrário do sistema francês, próximo daquele do Brasil, Cameron dependeu da formação do Parlamento em maio de 2010, e hoje governa não com a força de seu partido, mas tendo de negociar com a terceira força britânica, o partido dos Liberal-democratas do seu vice, Nick Clegg.
Mesmo assim, Cameron também enfrenta reformas fiscais e de previdência – e esse é um fenômeno que está se espalhando por toda Europa – mas, sobretudo, derivadas do governo trabalhista anterior. Cameron assumiu após 13 anos de governo trabalhista, enquanto o governo anterior a Sarkozy pertenceu à mesma linha ideológica.
O principal a se notar é que duas das três principais economias européias, sob o governo de dois líderes que tendem à direita e à redução de gastos, podem dar início ao passo final para a unificação completa da Europa. A Declaração Conjunta sobre Defesa e Cooperação em Segurança, uma das duas liberadas após a Cúpula, aponta na direção do tema do qual aborda.
O grande medo dos unionistas, que defendem o aprofundamento da integração econômica e política da Europa, com relação aos governos desta ideologia que estão assumindo poder num número cada vez maior de países na Europa foi, justamente, que as restrições econômicas, fiscais e políticas deles poderiam impedir este processo. Tradicionalmente mais nacionalistas e isolacionistas, estes governos deixariam de aprofundar a integração em troca da solução de problemas estritamente nacionais.
Porém, e como a Declaração sobre Defesa vem demonstrar, a integração econômica pode, sim, ser uma solução para os problemas internos e aprofundar a União Européia. Como afirma a Declaração, por exemplo, uma unificação do Complexo Armamentista Britânico e Francês poderia trazer uma economia de 30% a ambos os países. Da mesma forma, os dois governos se responsabilizam a levar em conjunto seus programas de armamento nuclear, inclusive com a criação de um laboratório nuclear conjunto.
O cerne da questão, aqui, é a de que a redução fiscal e as necessidades econômicas enfrentadas pela Europa se assemelham às da época de depois da Segunda Guerra Mundial. E, como depois da Guerra surgiu o Tratado de Roma em 1957 e o início da integração européia, os governos que buscam reduzir seus gastos e melhorar sua atividade econômica podem aprofundar sua integração econômica não apenas na Europa, mas também em outros blocos, como o Mercosul, sejam governos de direita, esquerda ou centro.
Gustavo Glodes-Blum é acadêmico do curso de Relações Internacionais do Centro Universitário Curitiba (UNICURITIBA), e Analista de Comércio Internacional da Câmara Americana de Comércio para o Brasil em Curitiba (AMCHAM Brasil – Curitiba).
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