Relembrando os Princípios Realistas de Hans Morgenthau
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Relembrando os Princípios Realistas de Hans Morgenthau



Por Rafael Pons Reis


Hans Morgenthau é um dos autores mais conhecidos dentro da área de Relações Internacionais. O autor recupera as críticas de Edward Carr sobre o Idealismo Moderno no sistema internacional, no entanto, seu pensamento se destaca por ter desenvolvido as bases teóricas do Realismo Moderno, que acabou sendo a perspectiva dominante na área das Relações Internacionais dos anos 40 até meados da década de 1970.

Morgenthau, juntamente com Carr, considera como premissas básicas: que o Estado é unitário, ou seja, o Estado é a base de análise da nação sendo a única voz dessa região no sistema internacional; os Estados são os principais atores no sistema internacional; os Estados são racionais, ou seja, agem com base nos seus próprios interesses a fim de maximizar seus benefícios; e o interesse nacional dos Estados tem como base garantir a sobrevivência e a integridade territorial no sistema internacional, assim necessitam enfocar na segurança dos mesmos.
A obra no qual Morgenthau desenvolveu as perspectivas teóricas do realismo foi A política entre as nações: a luta pelo poder e pela paz, publicado originalmente em 1948. O autor começa a obra estabelecendo os seis princípios básicos para a Política Internacional, que são:
1.     A política obedece a leis objetivas que são fruto da natureza humana. “Para estar em condições de melhorar a sociedade, é necessário entender previamente as leis pelas quais a sociedade se governa. Uma vez que a operação dessas leis independe, absolutamente, de nossas preferências, quaisquer homens que tentem desafiá-las terão de incorrer no risco de fracasso”.[1] Este principio retrata que tanto a nossa natureza humana como a política não são mudados de tempos em tempos, mas obedecem a leis objetivas. Assim, não se pode ignorar a natureza humana, que é a busca racional pela sobrevivência.
2.     O interesse dos Estados é sempre configurado em termos de poder. “Uma teoria política, de âmbito internacional ou nacional, desprovida desse conceito, seria inteiramente impossível, uma vez que, sem o mesmo, não poderíamos distinguir entre fatos políticos e não-políticos, nem poderíamos trazer sequer um mínimo de ordem sistêmica para a esfera política”. O interesse definido em termos de poder “permite como que remontar ou antecipar os passos que um político - passado, presente ou futuro - deu ou dará no cenário político”.[2] Este segundo principio quer dizer que os interesses dos Estados não são governados por influências morais, mas condicionados pela busca racional dos ganhos e perdas na política externa. Assim, a política exterior de país não deve estar associada às simpatias pessoais do governante, mas se guiar pelo interesse nacional da nação. Aqui podemos perceber a influência do pensamento de Maquiavel, realista clássico, no qual considerava que o príncipe virtuoso deveria agir em prol da nação e não a partir de suas preferências e gostos particulares.
3.     “O realismo parte do princípio de que seu conceito-chave de interesse definido como poder constitui uma categoria objetiva que é universalmente válida, mas não outorga a esse conceito um significado fixo e permanente”[3]. Este principio ressalta que as relações entre as nações sempre foram definidas em termos de poder. No entanto, o tipo de interesse das ações políticas varia dependendo de determinado contexto histórico cultural e político, sendo assim os interesses, que tem como base maximizar o poder dos Estados, não são fixos e permanentes.
4.     O realismo político conhece o significado moral da ação política e reconhece a inevitável tensão entre os preceitos morais e as exigências para que uma ação política tenha êxito. “O realismo sustenta que os princípios morais universais não podem ser aplicados às ações dos Estados em sua formulação universal abstrata, mas que devem ser filtrados por meio das circunstâncias concretas de tempo e lugar”. “Desse modo, o realismo considera que a prudência - a avaliação das consequências decorrentes de ações políticas alternativas - representa a virtude suprema na política. A ética, em abstrato, julga uma ação segundo a conformidade da mesma com a lei moral; a ética política julga uma ação tendo em vista as suas consequências políticas”.[4] Assim, termos gerais, a influencia da moral e da ética podem ser usados como mecanismos de justificação e legitimação da aça dos Estados, mas não servem para julgar o comportamento destes.
5.     “O realismo político recusa-se a identificar as aspirações morais de uma determinada nação com as leis morais que governam o universo”. “Uma coisa é saber que as nações estão sujeitas à lei moral, e outra, muito diferente, é pretender saber, com certeza, o que é bom ou mau no âmbito das relações entre nações”. [5] Aqui, o autor ressalta que os princípios morais de uma nação, seja os valores do bloco soviético ou da sociedade norte-americana, não devem ser aceitos como universais, pois nenhuma visão é a mais verdadeira ou a mais correta.
6.     “O realista político não ignora a existência nem a relevância de padrões de pensamento que não sejam os ditados pela política. Na qualidade de realista político, contudo, ele tem de subordinar esses padrões aos de caráter político e ele se afasta das outras escolas de pensamento quando estas impõem à esfera política quaisquer padrões de pensamento apropriados a outras esferas”.[6] Para Morgenthau, a esfera política é autônoma, não estando sujeita a nenhuma outra ciência como a economia ou o direito. A política internacional possui suas próprias leis e regras.
À guisa de conclusão, não poderíamos esgotar aqui em tão poucas linhas o pensamento realista de Hans Morgenthau. Sendo assim, nas próximas semanas continuaremos a discutir outras passagens importantes de sua seminal obra.

Rafael Pons Reis é Doutorando em Sociologia Política (UFSC) e Mestre em Relações Internacionais (UFRGS), e professor do Curso de Relações Internacionais do Centro Universitário Curitiba.


[1]Morgenthau, H. A política entre as nações: a luta pelo poder e pela paz. Brasília: Ed. Unb/Ipri, 2003. p. 4-5.
[2]Morgenthau, op. cit., p. 6-7.
[3]Morgenthau, op. cit., p. 16.
[4]Morgenthau, op. cit., p. 20-21.
[5]Morgenthau, op. cit., p. 21.
[6]Morgenthau, op. cit., p. 23.



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