Mundão
Vitória de um Presidente
Juliano da Silva CortinhasA morte de Osama bin Laden está sendo vista, principalmente pela população dos Estados Unidos, como uma grande “vitória” militar daquele país que, por meio de seus serviços de inteligência, encontrou o esconderijo do terrorista e matou seu inimigo número um, aumentando o nível de segurança internacional. A frase precisa ser interpretada de modo crítico para que o verdadeiro significado do evento possa ser compreendido. As relativizações em relação à sua importância política e estratégica são diversas, mas tentaremos resumi-las.
Primeiramente, Osama bin Laden somente pode ser considerado o inimigo número um dos Estados Unidos em termos retóricos e simbólicos. A guerra que os estadunidenses deflagraram, há dez anos, não é contra o líder da Al-Qaeda, mas contra o “terror”, que não é um alvo, mas uma tática de confronto, utilizada por grupos que não têm outros meios de luta. Nesse sentido, o terrorismo não nasceu ou morreu com Bin Laden. Osama era, simplesmente, um símbolo de uma estrutura que funciona de modo completamente descentralizado, a partir de decisões que são articuladas localmente, contra quaisquer representantes de um sistema que produz mais excluídos que incluídos. O terrorismo, uma tática perversa que generaliza seus inimigos, é o meio de luta de grupos que, normalmente, subvertem valores religiosos e políticos, utilizando-se da guerrilha e de quaisquer ferramentas de que disponham, sejam aviões de transporte civil ou bombas amarradas aos seus corpos. Por essa caracterização, só há uma maneira de vencer o “terror”: pela conquista dos “corações e mentes” dos possíveis adversários e pela sua inclusão no sistema político-econômico internacional. Tudo o que os Estados Unidos têm feito, desde 2001, é contrário a isso. As mortes de civis no Iraque e no Afeganistão, as torturas reveladas pela mídia internacional, a prisão de Guantánamo e outras tantas iniciativas são, potencialmente, instrumentos para que os terroristas consigam mais adeptos. O verdadeiro inimigo número um dos Estados Unidos não é Bin Laden, mas o próprio processo de implantação de suas políticas externas. Obama, em alguns momentos, parece perceber isso, mas não tem os instrumentos institucionais para construir mudanças definitivas.
Em segundo lugar, e em consequência das colocações anteriores, pode-se inferir que o fim de Bin Laden e, principalmente, as absurdas celebrações dos estadunidenses, comemorando a morte de um ser humano, tendem a fomentar o aumento do ódio aos Estados Unidos, minimizando, ainda mais, sua segurança internacional. Não é à toa que novos ataques terroristas são esperados.
Um terceiro ponto que deve ser discutido é o conceito de vitória da inteligência estadunidense na ação. Os Estados Unidos levaram dez anos para encontrar um indivíduo que estava vivendo a 700 metros de uma base militar paquistanesa, em uma mansão, no meio de uma cidade de porte médio do Paquistão. Não havia esconderijo nas cavernas e proteção de milhares de soldados tentando defender seu líder. Parece-nos, portanto, que a eficiência dos serviços de inteligência dos EUA não é tão grandiosa quanto Obama tem vendido. Apesar disso, diversas alterações que o atual presidente vem promovendo melhoraram o processo de coleta de informações pelos órgãos de inteligência. Barack Obama é responsável direto pela morte do líder da Al-Qaeda, pois aprimorou as estratégias incoerentes da gestão anterior. O ganho político para o presidente, que já inicia sua campanha de reeleição, será enorme; sua popularidade deve aumentar muito.
A morte de Bin Laden, portanto, foi importante não para os Estados Unidos, mas para seu presidente: a vitória foi mais política que militar. O nível de segurança de seu país, porém, não aumentará. A Al-Qaeda continuará atuando e o terrorismo continuará sendo uma tática importante de luta armada.
Artigo originalmente publicado no Jornal Gazeta do Povo em 04/05/2011.
Juliano da Silva Cortinhas, coordenador do curso de Relações Internacionais do Unicuritiba, é editor do blog Internacionalize-se (http://internacionalizese.blogspot.com).
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