Mundão
PERCURSO DA SOBERANIA NA LEI CONSTITUCIONAL ANGOLANA
PERCURSO DA SOBERANIA NA LEI CONSTITUCIONAL ANGOLANA
Por: Belarmino Van-Dúnem
A República de Angola desde a sua independência sempre se afirmou como um Estado soberano. A Lei Constitucional da Republica Popular de Angola de 12 de Novembro de 1975 define no seu artigo 1º que “A República popular de Angola é um Estado soberano, independente e democrático, cujo principal objectivo é a total libertação do Povo Angolano dos vestígios do colonialismo e da dominação e agressão do imperialismo e a construção dum país próspero e democrático, completamente livre de qualquer forma de exploração do homem pelo homem, materializando as aspirações das massas populares”. Portanto, a soberania sempre esteve na base da constituição angolana, o povo, na primeira fase, detinha as prorrogativas da soberania através da democracia popular.
No artigo 2º afirma que “toda a soberania reside no povo Angolano. Ao M.P.L.A., seu legitimo representante, constituído por uma larga frente em que se integram todas as forças patrióticas empenhadas na luta anti-imperialista, cabe a direcção política, económica e social do poder popular”. Neste sentido a soberania reside em cada dos cidadãos. Mas importa realçar que os pressupostos da soberania estavam, já na altura da independência, assentes na independência em relação às influências externas.
Um dos discurso do primeiro Presidente da República Popular de Angola, Doutor Agostinho Neto, dizia que “Angola é e será trincheira firme da revolução em África” e que “Angola não seria totalmente independente enquanto existisse algumas povos da região sob o jugo colonial ou outras formas de dominação”. Este discurso e espírito de ver a soberania já pressupõem a interdependência entre os Estados, uma vez que não é possível afirmar-se como soberano e independente de forma absoluta.
Já a lei constitucional de 7 de Fevereiro de 1978, consagra o Conselho de Revolução como um dos órgãos de soberania nacional, em substituição da Assembleia do Povo, o órgão supremo do poder do Estado e o presidente representa a Nação Angola (artigos 31 e 35 respectivamente). Nota-se que a soberania interna passa a ter órgãos representativos, facto que dará origem aos órgãos de soberania nacional que hoje existem. Esta concretização foi feita pela lei constitucional de 23 de Setembro de 1980, no artigo 37º que destaca a Assembleia do Povo como “ o órgão supremo de poder do Estado na República Popular de Angola e exprime a vontade soberana do povo Angolano…”.
A revisão da lei constitucional de 6 de Maio de 1991 marca uma reviravolta no conceito de soberania ao estabelecer, no artigo 1º, que a República de Angola é “uma Nação soberana e independente que tem como objectivo fundamental a construção de uma sociedade livre, democrática, de paz, justiça e progresso social”. O artigo 3º estabelece que a soberania reside no povo, que exerce o poder político através do sufrágio universal periódico para a escolha dos seus representantes, através do referendo e por outras formas de participação democrática dos cidadãos na vida da Nação. Neste caso, não devemos perder de vista que passamos de uma democracia popular para uma democracia multipartidária, esta é, sem sombra de dúvidas, a grande viragem no exercício da soberania por parte do povo angolano.
No artigo 6º aparece a delimitação do exercício da soberania por parte do Estado angolano “o Estado exerce a sua soberania sobre o território, as águas interiores e o mar territorial, bem como sobre o espaço aéreo, o solo e subsolo correspondentes”. Tendo como órgãos de soberania “o presidente da República, a Assembleia do Povo, o Governo e os Tribunais”. O artigo 50º afirma que “a Assembleia do Povo exprime a vontade soberana do povo Angolano e promove a realização dos objectivos gerais da República Popular de Angola.
A revisão da lei constitucional de 16 de Setembro 1992, no seu artigo 2º define a República de Angola como “um Estado democrático de direito que tem como fundamentos a unidade nacional, a dignidade da pessoa humana, o pluralismo de expressão e de organização política e o respeito e garantia dos direitos e liberdades fundamentais do homem, quer como individuo, quer como membro de grupos sociais organizados” e o artigo 3º reafirma o facto da “soberania residir no povo”. A Assembleia Nacional aparece como o órgão supremo de soberania que expressa a vontade soberana do povo angolano.
No concerne à soberania internacional, Angola sempre esteve consciente do facto de não ser possível se afirmar de forma absoluta e que o respeito pelas leis internacionais, nomeadamente a Carta das Nações, da ex-OUA actual União Africana e o respeito pela soberania dos Estados limítrofes constituem as bases para uma excelente coabitação internacional.
O espírito de interdependência faz com que Angola desde a sua independência aderisse a Organização de Unidade Africana, participa activamente como membro fundador da actual Comunidade de Desenvolvimento da África Austral, desde os tempos da organização dos Países da Linha da Frente, está presente na CEEAC, na Comissão do Golfo da Guiné e continua a primar pelo respeito em relação aos princípios explanados na Carta da ONU.
Neste momento, o país se encontra de novo perante um processo constituinte para se estabelecer na Lei mãe, como os angolanos irão exercer a sua soberania. Os ânimos estão ao rubro, principalmente entre os políticos. Mas não existem dúvidas que o MPLA será o partido responsável pela nova lei constitucional por ter a maioria absoluta na Assembleia Nacional, órgão que votará a última versão.
Apesar desta realidade, com verdadeiro sentido de Estado, o processo está a ser inclusivo. Todos angolanos são chamados a dar o seu contributo e as proposta dos partidos políticos com assento parlamentar serão colocadas à discussão pública, este facto dá um cunho verdadeiramente nacional ao modelo de constituição que será aprovado.
Tendo em conta o processo e a fase actual do desenvolvimento económico e social de Angola, mas também a consolidação da reconciliação nacional, penso que a nova lei constitucional deverá espelhar o actual contexto nacional em todos aspectos da sociedade porque no fundo o contexto é que conta para a eficiência e Eficácia da lei. A forma de exercer a soberania por parte do povo deve estar bem definida, ou seja, como os angolanos irão transmitir o seu poder aos detentores do poder politico e importa ainda realçar que todos os modelos são bons, tudo depende do contexto. Os três projectos em debate: a) Sistema Presidencialista; b) Sistema Semi-Presidencialista e; c) Sistema Presidencialista Parlamentar têm pontos bastantes positivos, mas também algumas debilidades, portanto tudo depende da conjuntura e das circunstancia em que Angola se encontra.
Importa reflectir sobre as palavras do Presidente José Eduardo dos Santos que já em 1980 dizia: “Nós temos afirmado e reafirmado que não nos importa que as nossas opções políticas e ideológicas não agradem aos outros. O que importa é que elas sirvam ao nosso povo. Por isso, nem as hostilidades diplomáticas e militares, nem as pressões políticas impedirão que o povo angolano se afirme no mundo, com a sua personalidade própria, como Nação livre e soberana".
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