Nações Unidas na Líbia: mais um capítulo de infâmia na história de uma instituição degenerada.
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Nações Unidas na Líbia: mais um capítulo de infâmia na história de uma instituição degenerada.


Por Carlos-Magno Esteves Vasconcellos*


ONU: com o mundo nas mãos.
A história mais recente das Nações Unidas (ONU) é marcada por fracassos, humilhações e ações desmoralizadoras e desmoralizantes. Não é preciso uma memória muito acurada para relembrar alguns capítulos dessa história miserável: a incapacidade de colocar termo à prisão de Guantánamo, as Guerras da Iugoslávia e de Ruanda na década de 1990, as Guerras do Afeganistão, do Iraque, do Darfur e da Somália na primeira década do século XX, a impotência diante da barbárie de Abu Ghraib, e a incapacidade de diálogo com o Irã e a Coréia do Norte.
Há cerca de dez dias, o Conselho de Segurança da ONU começou a escrever mais um capítulo de infâmia na história da instituição: aprovou uma resolução para a criação de uma zona de exclusão aérea na Líbia, autorizando os Estados membros (leia-se: Estados Unidos, França, Grã-Bretanha, Itália, e outros países-lacaios) a empregar todos os meios necessários para proteger as áreas com população civil ameaçadas de ataques pelas forças de Mouammar Kadafi.
O que motivou a decisão da ONU? Teria sido o compromisso das Nações Unidas em lutar contra governos nacionais autoritários? Impossível! Pelo menos é isso que garante a cláusula sétima do artigo 2 da Carta da ONU: “Nenhum dispositivo da presente Carta autorizará as Nações Unidas a intervirem em assuntos que dependam essencialmente da jurisdição de qualquer Estado ou obrigará os Membros a submeterem tais assuntos a uma solução, nos termos da presente Carta; este princípio, porém, não prejudicará a aplicação das medidas coercitivas constantes do Capitulo VII[1]”. (http://www.onu-brasil.org.br/documentos_carta.php) Ademais, a resolução aprovada pelo Conselho de Segurança foi apresentada sob os auspícios da França, Grã-Bretanha e Estados Unidos, países que jamais se incomodaram com regimes ditatoriais, desde que submissos aos seus interesses imperialistas, como o demonstram as experiências do Brasil dos generais, do Chile de Pinochet, do Haiti de Baby Doc, da Uganda de Idi Amin Dada, das Filipinas de Ferdinand Marcos, do Irã de Reza Pahlevi, do Zaire de Mobutu, e tantos outros.
Teria sido o compromisso das Nações Unidas com questões humanitárias? Impossível! As Nações Unidas nunca se engajaram com tamanha voracidade na luta pela preservação da dignidade humana. Não bastassem os exemplos citados acima, em que a ONU atuou como sujeito ou foi conivente com o genocídio de milhões de civis inocentes, vale à pena lembrar: o que tem feito as Nações Unidas para socorrer os que vivem sob a ameaça de morte por inanição mundo afora? Com que virilidade tem combatido o narcotráfico internacional?  O que tem feito a ONU contra o comércio mundial de armas que não para de crescer, sob a liderança de Estados Unidos, França e Grã-Bretanha? Quanto tempo as Nações Unidas ficaram observando inertes às experiências de transnacionais farmacêuticas norte-americanas e européias com cobaias humanas de países subdesenvolvidos?
O compromisso da ONU com questões humanitárias é meramente retórico e demagógico, legitimador das ações mais abjetas que se possa imaginar, em benefício de um punhado de países desenvolvidos[2]. Aliás, a maneira com que a ONU vem tentando resolver os problemas no mundo hodierno – desprezando o diálogo e se precipitando no uso da força militar – tem se constituído em um desserviço à paz e aos propósitos humanitários mundiais por ela apregoados. 
A vergonhosa e infame resolução da ONU sobre a Líbia está transformando um conflito de classes de âmbito e configuração nacionais em uma guerra internacional. Neste domingo (27/03) as agências internacionais de notícias deram conta de bombardeios sobre Trípoli. Dentro em pouco estaremos contando mais uma montanha de cadáveres. E, junto com eles, o cadáver daquilo que um dia os idealizadores das Nações Unidas, orgulhosamente, chamaram de “direito de autodeterminação dos povos”, como rege ainda hoje a cláusula segunda do artigo 1 da Carta da ONU.


*Carlos-Magno Esteves Vasconcellos é doutor em Ciências Econômicas pela Escola Superior de Economia de Varsóvia (Polônia) e professor titular de Economia Política Internacional do UniCuritiba.


[1] O artigo 42 do capítulo 7 da Carta da ONU, que se refere ao emprego de força militar, alude, única e exclusivamente, à segurança internacional, o que não se aplica ao caso da Líbia.
[2] A dissimulação dos interesses reais da ONU na Líbia parece estar se esfumaçando.  Neste domingo (27 de março), o Secretário de Defesa do Reino Unido, Sr. Liam Fox, confessou: “Enquanto se movimentem ao longo da costa, certamente, os rebeldes controlarão cada vez mais os pontos de saída do petróleo da Líbia e, se continuarem se movimentando de Brega a Ras Lanuf, significa que terão o controle das exportações de petróleo da Líbia”. (http://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/efe/2011/03/27/para-secretario-britanico-rebeldes-libios-estao-perto-de-controlar-petroleo.jhtm) Era esse o objetivo da resolução das Nações Unidas, contra Kadafi?
 



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