Mundão
Alguém se lembra da Rodada Doha?
(Texto originalmente publicado em julho de 2010, no periódico online O Estado RJ.)
A cúpula do G20 financeiro, realizada em junho deste ano no Canadá, parece ter sido um sucesso ao conseguir a consolidação da reforma do sistema financeiro mundial. Além disso, o comunicado final do evento transcreve a recomendação de se reduzir pela metade os déficits comerciais dos países desenvolvidos até 2013. No entanto, negociações no campo mercantil não avançaram, e a Rodada Doha poderá não ser concluída até o final deste ano. E isso é ruim? Sim. Principalmente para o setor primário exportador brasileiro.
Para quem não se lembra da Rodada Doha, ela foi iniciada em 2001, e há esperança de que seja concluída ainda no final deste ano, sendo a mais longa rodada de negociações comerciais (fora programada para durar até 2005) e a primeira realizada no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC). Também conhecida como a Rodada do Desenvolvimento, expunha o fato de a OMC reconhecer que o comércio é o caminho para os países periféricos se desenvolverem. Contudo, as negociações permanecem estagnadas devido à intransigência de desenvolvidos e de periféricos.
Do lado dos Estados Unidos e dos países-membros da União Europeia, o grande problema reside na dificuldade da eliminação de subsídios agrícolas à produção e à exportação, no caso norte-americano, a situação pode ser facilitada com uma nova Farm Bill (lei agrícola) a ser aprovada em 2012 pelo congresso daquele país (tema bastante discutido com referência à possibilidade de retaliação brasileira aos EUA por causa de subsídios ao setor algodoeiro). Já para a União Europeia, o problema estaria voltado para a segurança alimentar. A retirada dos pagamentos ao produtor é mais complicada devido à questão cultural, por causa das guerras do século XX, e à manutenção da população no campo.
Se, por um lado, EUA e União Europeia são os grandes vilões no impedimento do acesso aos mercados agrícolas, o Brasil figura como vilão, juntamente com a Índia, na questão sobre a entrada de serviços e de produtos manufaturados em seus territórios. Ninguém cede; há claramente um impasse. Doha tem como objetivo liberalizar o comércio mundial, mas após a última crise financeira e as tentativas de se restabelecer as contas internas e externas dos países atingidos, a Rodada parece estar longe de uma conclusão. Depois da declaração de Barack Obama de que não concorda com a conclusão de Doha nos termos atuais, o desfecho da Rodada do Desenvolvimento parece estar bem distante de 2010.
Para os exportadores agrícolas brasileiros, a melhor opção seria buscar novos mercados, como o de Guiné Equatorial, sob regime autoritário desde 1979. Celso Amorim declarou que “negócios são negócios”, e ele está certo. Não significa a legitimação do regime daquele país. Afinal, em momentos de dificuldades comerciais, o Itamaraty já buscou outros mercados (países árabes, africanos, asiáticos e, inclusive, comunistas), sob a presidência de Kubitscheck, Quadros, Goulart, até mesmo Geisel, e hoje sob o Governo Lula. E mesmo Estados desenvolvidos mantêm relações comerciais pragmáticas com países sob regime autoritário. Muitos, inclusive, as mantiveram com o Brasil ao longo do regime militar brasileiro, sem questioná-lo, como os EUA.
Já a entrada da Guiné Equatorial na Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) é outra história. Em verdade, ela torna-se mais uma tentativa de protagonismo internacional do Governo Lula, ao tentar fazer com que aquele Estado se transforme em uma democracia para entrar no organismo. Percebe-se que o vínculo comercial muitas vezes tem o poder de forçar uma mudança de regime político. Basta observar os efeitos de sanções comerciais. E apesar das crescentes críticas da mídia a respeito do tema, pode ser uma medida que funcione. Esperemos para saber.
Alessandra Baldner
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